Laura Monte Serrat Barbosa, psicopedagoga, fala sobre limites, na entrevista feita pela revista A&E.
Depois de uma geração criada na base do prazer, sem regras definidas e com a permissividade como premissa, as famílias e as escolas começam a concordar com uma coisa quando o assunto é educação: as crianças precisam, sim, de limites e as regras são fundamentais no processo educativo. Aplicá-las é o grande desafio para pais e professores em uma realidade onde as crianças são extremamente criativas sabem argumentar e “confundem” educadores com tanta informação. Para entender como acontece esse processo na sociedade atual, a pedagoga e psicopedagoga Laura Monte Serrat Barbosa, uma das profissionais mais conceituadas em educação no país, sugere que é preciso olhar para trás, analisar o comportamento das gerações anteriores e estudar o desenvolvimento das crianças. Ao analisar esse processo, Laura coloca como base a ideia que tem sobre a educação. Para ela, educar é humanizar, o que só acontece quando se cumprem regras. “E quem não aprende a enfrentar frustrações e dificuldades, não aprende a se tornar humano”, salienta.Nesse contexto, Laura trabalha uma linha que defende a construção de três tipos de limites: o da restrição, o da fronteira e o da superação.
O limite da restrição: o que é feio, o que é bonito para os pais, o que eles gostam ou não. Não dá para deixar a criança decidir alguma coisa que normalmente não poderia decidir sozinha. O segundo limite é o limite da fronteira que define o quanto eu permito que o outro invada e o quanto eu posso invadir. Um exemplo: a criança vem dar aquele beijo lambido, e eu conto para ela que este é o meu limite, eu não gosto. Não é proibido, não significa que ela não possa fazer isso com outras pessoas, mas esse é o meu limite. Ou então eu posso dizer “eu não gosto que você grite comigo”. E então comigo você não vai gritar porque esse é o meu limite. Mas, ao mesmo tempo, é preciso perceber o limite da criança, sem que ela seja exposta ou humilhada. Não vou gritar com ela na frente dos outros, porque esse é o limite que estabelece uma fronteira entre o que eu posso fazer para educá-la e o que é passível de ser entendido por ela. E o terceiro é o limite que deveria ser mais usado pela escola e pela educação das famílias. O limite da superação foi trazido pelo psicólogo Yves de La Taille e que existe para ser superado. Na educação autoritária, usamos o limite da restrição, que diz “não, não e não”. O “não” sozinho estabelece normas, mas não consegue dar conta de tudo porque existem limites que precisam ser superados. Então eu posso, em vez de dizer não para o meu filho de sete anos que pede um celular, explicar que quando ele fizer 12 anos ele vai ganhar um. Assim, eu estabeleço um limite que precisa ser superado.
Katia Michelle Pires, a jornalista, pergunta se existe punição e Laura Barbosa responde que às vezes precisa. Mas na visão que eu trabalho, a gente chama a punição de sanção por reciprocidade, que tem a ver com o que foi feito. Não é assim “você não fez então vai tirar zero na prova”, ou “você fez então vai ganhar uma bicicleta”. Se a criança não estudou na hora que tinha que estudar, então na hora de brincar não pode brincar, vai estudar. É algo recíproco que define a sanção. Se a criança jogou um objeto no chão porque está com raiva, primeiro vai precisar organizar a bagunça e depois vai ter que providenciar um novo objeto.
Katia Michelle pergunta novamente a Laura Barbosa; a senhora acha que este é um dos grandes desafios na educação contemporânea, descobrir limites? Como pais e professores podem chegar a um consenso? E a psicopedagoga responde dizendo que a primeira dica é estudar o desenvolvimento da criança. Tem muita coisa que a criança faz que parte do desenvolvimento e que está sendo entendido como patologia, distúrbio ou transtorno. Se uma criança de dois anos faz uma birra no supermercado, o limite é o de restrição: pegar a criança no colo, tirar da platéia e sair do supermercado. Na próxima vez, explicar que ela não vai porque ainda não cresceu para entender que não pode agir daquela maneira. Se isso for feito uma ou duas vezes, a criança não faz mais birra. Se continua é porque a mãe ou o pai confundiu esse limite. No momento em que a sanção não é por reciprocidade, a criança acaba ensinando aos pais que consegue o que quer berrando. Agora, se é uma criança de sete anos fazendo birra para conseguir o que quer, é muito mais grave. Para a de dois anos, faz parte do desenvolvimento. Para criança de sete anos, essa atitude não é mais esperada, pois ela já sabe argumentar e contar porque está agindo assim. Às vezes é preciso até pedir a ajuda de profissionais para contornar a situação.
LAURA MONTE SERRAT BARBOSA é pedagoga e psicopedagoga, é um dos nomes fortes no cenário brasileiro quando o assunto é educação. Atua, principalmente, nas seguintes áreas: projeto de aprender, atuação psicopedagógica, dificuldade de aprendizagem, avaliação psicopedagógica institucional, instituição escolar, inclusão, relação professor/aluno, operatividade na aprendizagem e desenvolvimento simbólico no processo de aprender. É autora de diversos livros, entre eles, “A educação de crianças pequenas” (Pulso Editorial), de 2006.